Princípios Anarquistas

“Nós desejamos a liberdade e o bem-estar de todos os homens, de todos sem exceção. Queremos que cada ser humano possa se desenvolver e viver do modo mais feliz possível. E acreditamos que esta liberdade e este bem-estar não poderão ser dados por um homem ou por um partido, mas todos deverão descobrir neles mesmos suas condições, e conquistá-las.
Consideramos que somente a mais completa aplicação do princípio da solidariedade pode destruir a guerra, a opressão e a exploração, e a solidariedade só pode nascer do livre acordo, da harmonização espontânea e desejada de todos os interessados.”
Errico Malatesta

Em síntese, tais princípios são:

1. Liberdade

A Liberdade é o princípio basilar do Anarquismo. A luta pela Liberdade antecede a Anarquia. O desejo de ser livre – das contingências da natureza, a princípio e, em um segundo momento, dos próprios predadores humanos, que por meio de instrumentos de dominação sufocam a verdadeira dinâmica social igualitária e fraterna – constitui o eixo em torno do qual, em um processo permanente, giram as transformações históricas, sociais, políticas e econômicas. A Liberdade Individual, no entanto, só pode encontrar sua expressão maior na Liberdade Coletiva. Os Estados, o capitalismo e sua decorrência, a sociedade de classes, os falsos princípios educacionais, as práticas familiares autoritárias e as ideologias de massa alienantes, assim como as teorias de emancipação social equivocadas, que levam à formação de novas tiranias, constituem, atualmente, os maiores obstáculos ao pleno desenvolvimento libertário da humanidade.

2. Ética e Valores

A Ética Libertária é sinônimo de Anarquismo, e é a sua espinha dorsal. É um compromisso militante inegociável, e pressupõe a coerência entre a vida e a ideologia, ou seja, viver o Anarquismo. Entendemos que os fins estão nos meios, assim como a árvore está na semente, e que só chegaremos a fins libertários com responsabilidade política e através de meios libertários. A Ética é exercida no respeito mútuo, e tem por função definir a prioridade dos valores.

3. Federalismo


É um método de organização política, não hierarquizada, da sociedade. Pressupõe a descentralização do processo de decisão e possibilita a integração dos núcleos autogestionados, em todos os níveis.
Baseia-se no Apoio Mútuo e na Livre Associação, havendo iguais direitos e deveres para todos. Entendemos como fundamental que as unidades federadas exerçam seu direito de deliberar, através de delegações tiradas nas assembléias de base, orientando-se pelos princípios acordados, tendo o compromisso orgânico e militante de acatar as deliberações do conselho de delegados, respeitando, assim, as decisões do órgão federativo.

4. Internacionalismo

Exerce-se, na prática, através do Federalismo. Compreendemos que o Internacionalismo é enriquecido pelo respeito às diversidades das identidades culturais e é praticado pela solidariedade das lutas e através da Autogestão Social.
5. Autogestão
Método anticapitalista e antiestastista de gestão sócio-econômica aplicável em todos os níveis. Caracteriza-se como a gestão dos meios de produção e organização social em benefício da coletividade; é exercida desde as entidades de base, com igualdade de direitos e participação de todos os responsáveis.
A Autogestão, como um processo de construção do novo, ainda que convivendo com o ultrapassado sistema atual, potencializa as transformações que apontam para uma sociedade igualitária.

6. Ação Direta


Método de atuação baseado no protagonismo individual e coletivo. É pautada pela horizontalidade e pelo mínimo de intermediação que, quando necessária, não implique no surgimento de centros de decisão separados dos interessados.
A Ação Direta se expressa em múltiplas variantes e em todos os níveis e expressões, ligando os trabalhadores e oprimidos ao centro da ação política.
“Só a Ação Direta abala tronos, ameaça tiranias, convolve mundos, só ela, principalmente, educa e fortifica o povo espoliado, na sua luta milenar. Ação Direta é a revolução.” (José Oiticica)

7. Classismo

Afirmamos a nossa identidade como trabalhadores. Combatemos por uma sociedade sem classes, em que todos trabalhem e tenham direito a uma vida digna. Para se conquistar esse objetivo, enfrentamos consciente e cotidianamente uma luta de classes contra as elites exploradoras e o Estado. Acreditamos que o fim da sociedade de classes só será alcançado com a emancipação dos oprimidos no processo da Revolução Social.

8. Prática Política e Inserção Social

Entendemos que, como trabalhadores, devemos pautar nossa intervenção a partir de nossa própria realidade social. Tendo por base as lutas que enfrentamos em nosso cotidiano. Entretanto, tendo em vista que nós, anarquistas, consideramos que a atuação política passa por um comprometimento maior com as causas sociais, devemos buscar sempre relacionar nossa própria prática militante com as diversas manifestações das lutas populares. Portanto, acreditamos que qualquer manifestação neste sentido nos campos social, cultural, do campesinato, sindical, estudantil, comunitário, ecológico, etc desde que inseridas no contexto das lutas pela Liberdade contemplam a nossa prática política de Inserção Social.

9. Apoio Mútuo

Propomo-nos a realizar a solidariedade ativa nas lutas, irmanando-nos com todos(as) os(as) companheiros(as) que trabalhem verdadeiramente por um mundo mais justo e igualitário. Assim, consideramos que o Apoio Mútuo é uma conseqüência lógica e direta do conjunto de princípios do Anarquismo, uma vez que só conseguiremos implementá-los através da solidariedade efetiva entre os explorados e oprimidos.

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Nossa concepção é a de que o Anarquismo, como pensamento social, não permita separar teoria da prática, meios de fins e ação de transformação; não permita enquadramentos em esquemas rígidos que pretendam estabelecer, para as atitudes dos militantes, um modelo abstrato que determine seus princípios e estratégias. O Anarquismo, por ser antidogmático e estabelecer como sua questão fundamental a Liberdade, busca nas evidentes contradições do sistema capitalista o seu campo de ação. Portanto, é no interior da luta de classes que devem estar os anarquistas, enquanto houver uma sociedade de oprimidos e opressores, de patrões e trabalhadores, de proprietários e despossuídos. Entretanto, por entenderem os anarquistas que a luta de classe é um meio e não um fim, devem estar em alerta para determinadas interpretações de sentido autoritário que concebem a história como mero resultado da luta entre as classes. Se realmente há um fator que transforma a história para os libertários, ele só pode ser resultado da luta engendrada continuamente pelos revolucionários contra a opressão e em busca de solidariedade. Não é, para os anarquistas, o homem, na nova sociedade, um simples resultado do materialismo histórico. Homens não são forjados pelas marteladas desferidas pelas dialéticas predeterminadas ou por algum esquema que lhes transcende a ação concreta.
Portanto, a Ação Direta não é apenas um meio, ou metodologia, de combate, mas sim a única forma de materializar em atitudes as vontades de transformação individuais e coletivas. Dessa forma, os anarquistas, que nunca buscaram uma sistematização cientificista de seu pensamento social, afirmam que só de atitudes concretas pode resultar o processo radical de transformação.
Sem amos ou dogmas, os militantes libertários seguem defendendo a inserção social nas questões mais prementes de suas vidas. Tal relação coloca nas mãos do povo e demais grupos organizados a tarefa de modificar tudo a favor de todos. Pensamos que a Anarquia esteve presente nas sociedades sem classes de ontem, e continua, nas de hoje, não por representar o resultado de contradições econômicas, mas por expressar, na mais plena forma, o desejo de Liberdade comum a todos os indivíduos e coletividades através dos tempos. Para tanto, o Anarquismo serviu, nos séculos XIX e XX, como importante inspiração para a luta contra a burguesia, assim como deverá determinar os padrões éticos da futura Sociedade Anárquica.