O Anarquismo não é outro regime de
governo, mas sim um modo de organização social livre e cooperativo.
O
Anarquismo,
acaba com a organização social onde um, quer sempre mandar no
outro. Nele, ninguém é obrigado a fazer nada que não tenha
vontade, nem muito menos a aceitar pontos de vista divergentes
aos seus. Nos regimes de governo, o indivíduo é quem tem que
abandonar sua natureza e adaptar-se aos padrões impostos pelos
aparelhos de poder, já no Anarquismo não é o indivíduo que tem
que se adaptar a sociedade, mas sim a sociedade que tem que se
adaptar ao indivíduo. O Anarquismo permite que as próprias
pessoas decidam os rumos de suas vidas e construam a
organização de sua vida social. Só quem sabe o que é melhor
para uma pessoa é a própria pessoa. Nele, as pessoas se
reúnem em grupos (se quiserem) e decidem entre si o que é
melhor para todas. Essa forma de organização Anarquista
chama-se AUTOGESTÃO. Autogestão, significa AUTONOMIA, ou
seja, governo das pessoas por elas mesmas, sem ninguém para
liderá-las ou dize-las o que podem ou não fazer. Essa forma
de organização faz com que as riquezas produzidas pela sociedade
fiquem diretamente nas mãos de quem pertencem, ou seja, seus
produtores.
O Anarquismo abre caminhos ainda que
as pessoas nadem contra a correnteza, vivendo o Anarquismo do
modo que o concebem, seja individualmente, isoladamente ou até
mesmo ciganamente. A lei da vida é o amor… mas o amor sob vontade.
Todo mundo tem direito de viver a vida da maneira que quiser.
O Anarquismo não quer o poder… pois é incompatível com ele. O
Anarquismo virá de uma Revolução Social que se dará na base
de todas organizações sociais existentes até hoje… ou
seja, de uma Revolução que se dará dentro das pessoas. Se as
pessoas pararem e decidirem que não mais serão escravas dos
governos e que desejam ser livres… a liberdade estará a um passo
delas. Por isso o Movimento Anarquista não compactua com
eleições, partidos políticos ou coisas do gênero. Sob o ponto de
vista Anarquista, todo aquele que visa o poder sobre seus semelhantes
é inimigo da liberdade dos mesmos. Se alguém quer mandar em você,
isso quer dizer que quer te privar de tomar decisões sobre sua
própria vida… ou seja, esse alguém quer te escravizar.
Mas e a comida? E as
roupas? Quem vai dividir todas as coisas?
Na Autogestão, todo mundo parte de
um princípio lógico: se não produzir não tem comida, se não
fabricar não tem vestimenta; se não construir não tem casa. Então
cada um produz de acordo com suas possibilidades, trabalhando
naquilo que gosta, na hora e período que quiser. Cada um fazendo um
pouquinho daquilo que mais sabe fazer irá dar a sociedade uma
qualidade ótima de vida. Analise bem: quantas pessoas trabalham mal
hoje em dia, fazem coisas que não gostam de fazer só por causa do
dinheiro? E o imenso número de desempregados, de pessoas sem
oportunidades nessa sociedade que sabem fazer (e gostam) muitas
coisas mas não tem recursos. Já pensou todo mundo plantando,
colhendo, fabricando, costurando, montando… só um pouquinho cada
um. Você acha que alguma coisa irá faltar? Hoje só existe um
desequilíbrio na sociedade porque, além das pessoas produzirem sob
pressão, o fruto de toda produção fica nas mãos da casta
governante e de toda sociedade que é movida pelo maior inimigo da
cooperação humana: o dinheiro. Dinheiro na sociedade de hoje
significa recursos (comida, roupa, etc.) e quem tem mais recursos
vive melhor… isso gera outra coisa inimiga da solidariedade humana:
a competição. O anarquismo põe abaixo todo esse esquema social
doente em que somos obrigados a viver nos dias de hoje. No lugar do
dinheiro a troca, a compartilhação. No lugar da competição, a
solidariedade. Todo mundo que da sua forma, de acordo com suas
possibilidades, colabora com a sociedade, tem direito aos frutos de
seu trabalho. Da mesma maneira que cada um produz de forma diferente,
da forma que mais lhe agrada, que mais se adapta as suas capacidades
individuais, cada um também deve consumir da mesma forma, de acordo
com suas necessidades, suas vontades pessoais. Nenhum tipo de
racionamento seria justo visto que cada pessoa tem necessidades
diferentes… Alguns comem mais, outros comem menos… Alguns sentem
mais frio, outros mais calor… Enfim, cada pessoa tem suas
particularidades e o Anarquismo possibilita que estas sejam
respeitadas. Para se entender de forma definitiva a forma de
organização social Anarquista deve-se perceber que nela todo fruto
do trabalho de todos, da produção efetuada na sociedade autogerida,
pertence à seus produtores (ou seja, a todos) e deve ser consumido
pelos próprios de modo que todos fiquem satisfeitos. Ninguém é
dono das cidades, dos mares, da terra, das florestas… mas ao mesmo
tempo tudo pertence a todo mundo e qualquer desrespeito ao que é de
todos consecutivamente é um desrespeito a todos. Ninguém pode
chegar e dizer “esse rio é meu” porque não é só ele que vive
do rio, que bebe de sua água… Mas se só uma pessoa usa uma calça,
essa pode com certeza dizer “essa calça é minha”. Deu pra
sentir a diferença?
Mas e as pessoas que não
quiserem colaborar? E quanto aos crimes?
Partindo do princípio básico de
que ninguém é obrigado a fazer nada que não tenha vontade, não
podemos obrigar uma pessoa a cooperar com a sociedade. Mas como a
sociedade Anarquista possibilita que cada um viva sua vida como
quiser, essa pessoa pode viver o Anarquismo de sua forma (contanto
que – já que não compactua – não interfira no Anarquismo das
outras) e sobreviver como quiser (contanto também que não cause mal
as pessoas que também vivem da maneira que querem). É tudo uma
questão básica de respeito mutuo. Acima de a liberdade do próximo
terminar onde começa a minha, a liberdade do próximo é uma
extensão da NOSSA liberdade. Qualquer pessoa com o mínimo de senso
pode sentir que a maioria dos crimes derivam da desgraça econômica
em que o mundo vive, da forma organizativa social em que vivem as
pessoas. Os governantes dominam as pessoas com violência e a
violência só faz gerar mais violência ainda. Vivendo sob pressão
qualquer ser (não só as pessoas mas até mesmo os animais) torna-se
bruto e enfurecido. A violência não resolve nada, só piora. O
Anarquismo propõe uma nova sociedade onde todas as pessoas tenham
iguais oportunidades e direitos. Tudo isso com certeza reduzirá em
muito a margem de criminalidade. Mesmo assim, os seres humanos não
são perfeitos e todos nós não estamos esclusos de tomar atitudes
brutas ou que venhamos a ter posteriormente arrependimentos. Um dos
objetivos do Anarquismo é ensinar as pessoas a ter responsabilidades
sobre seus atos, pois todo ato com certeza tem uma consequência. O
Anarquismo pede as pessoas principalmente respeito mútuo e senso de
responsabilidade. Sempre haverão casos de divergências pois nenhuma
pessoa pensa absolutamente igual a outra. O que as pessoas precisam
aprender é a conviver com suas divergências, a viabilizar meios de
vida que possibilitem a todas as pessoas viverem de acordo com seus
pontos de vista. É natural dos seres humanos concordar ou discordar…
Quando a compactuação for impossível, deve-se pelo menos saber
respeitar ambos pontos de vista. A verdade de um pode não ser a
verdade do outro, mas cada um deve ter direito de viver a sua
verdade.
Como participar da cultura
anarquista?
A única coisa necessária para se
aderir ao Movimento Anarquista é ser Anarquista… da sua forma…
segundo sua utopia pessoal de sociedade futura, seja essa
coletivista, mutualista, individualista ou seja o que for. Cada um
tem o seu modo de ver o Anarquismo, a sua concepção de vida em
liberdade (lembre-se de que no anarquismo, é a sociedade quem se
adapta ao indivíduo) e a sociedade futura será o resultado da união
de todas as utopias libertárias, de todas aspirações e vontades
das pessoas. Seja Anarquista da sua forma, do seu jeito, sozinho ou
em grupo, mas seja você mesmo. Manifeste suas ideias, imagine sua
utopia libertária (o que seria viver em liberdade para você), não
feche a boca, não abaixe a cabeça. Aquele que te escraviza é o seu
inimigo, aquele que quer te prender consecutivamente não quer sua
liberdade. Desobedeça as imposições, obedeça somente a seu
próprio coração. Seja a ovelha negra, o filho rebelde, a ferrugem
na engrenagem social. Não deixe seus sonhos, lute por suas
convicções. Conspire… divulgue o Anarquismo a seus colegas…
mostre a eles que todos somos capazes de governar nossas próprias
vidas… as limitações existem para serem abolidas… as fronteiras
para serem ignoradas… os muros para serem derrubados. Morda a maçã
do pecado… se ser livre é subversão… seja subversivo. O seu
sonho é a sua verdade… você não é obrigado a aceitar as
verdades de outras pessoas. A sua liberdade é seu maior tesouro…
Estar vivo sem liberdade é como beber água sem matar a sede… seja
realista… deseje o impossível. Conheça a história do Movimento
Anarquista mas faça você também a sua história. Veja o que outros
Anarquistas disseram mas diga você também aquilo que pensa. Ninguém
é mais do que ninguém. Cada pessoa é uma estrela e todas estrelas
são iguais.
Observações necessárias:
Algumas observações se fazem
necessárias, para esta publicação.
a) Este informativo não pode ser
vendido.
b) Este informativo pode e deve ser
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estiver ao seu alcance.
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parte deste informativo desde que você cite de onde saiu o texto e
se possível o endereço para divulgação da ideia.
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materiais, façam perguntas, deem sugestões, critiquem.
O que querem os Anarquistas?
Em artigo
bastante contundente e expressivo, Errico Malatesta, discípulo
italiano do russo Bakunin,
discorre sobre o que é e o que se deve fazer “Rumo à Anarquia”.
Em
primeiro lugar, deve-se desprezar concepções errôneas segundo as
quais “anarquia”
seria sinônimo de “bagunça”. Anarquia é ausência de governo e
mesmo de atividade parlamentar; que os agentes políticos devem atuar
diretamente em busca de manter e ampliar todas as formas de
participação nos aspectos decisórios da sociedade em que vivem.
Ação Direta, aliás, é o nome que adotam várias organizações
anarquistas pelo mundo afora.
Diz-nos
Malatesta
em seus “Escritos Revolucionários” que “Se quiséssemos
substituir um governo por outro, isto é, impor nossa vontade aos
outros, bastaria, para isso, adquirir a força material indispensável
para abater os opressores e colocarmo-nos em seu lugar * Mas,
ao contrário, queremos a Anarquia, isto é, uma sociedade fundada
sobre o livre e voluntário acordo, na qual ninguém possa impor sua
vontade a outrem, onde todos possam fazer como bem entenderem e
concorrer voluntariamente para o bem-estar geral. Seu triunfo só
poderá ser definitivo quando universalmente os homens não mais
quiserem ser comandados ou comandar outras pessoas e tiverem
compreendido as vantagens da solidariedade para saber organizar um
sistema social no qual não mais haverá qualquer marca de violência
ou coação”.
A
atividade do anarquista, do socialista utópico (em sua sublime
acepção de conquista da Esperança possível) não é violenta nem
repentina, mas gradual, pedagógica, passo a passo.
“Não
se trata de chegar à anarquia hoje, amanhã ou em dez séculos, mas
caminhar seguramente rumo à anarquia hoje, amanhã e sempre. A
anarquia é a abolição do roubo e da opressão do homem pelo homem,
quer dizer, abolição da propriedade privada dos meios materiais e
espirituais de produção e do governo formal; a anarquia é a
destruição da miséria, da superstição e do ódio entre as
pessoas. Portanto, cada golpe desferido nas instituições da
propriedade privada dos meios de produção e do governo é um passo
rumo à anarquia. Cada mentira desvelada, cada parcela de atividade
humana subtraída ao controle da autoridade, cada esforço tendendo a
elevar a consciência popular e a aumentar o espírito de
solidariedade e de iniciativa, assim com a igualar as condições é
um passo a mais rumo à anarquia.”
Os surrealistas, que há anos estão
unidos aos anarquistas afirmam ainda que cada vez que um casal se une
e sua união não é uma fancaria, mas a autêntica expressão do
verdadeiro amor entre duas pessoas que se completam plenamente,
ocorre mais um abalo no que chamam de “gigantesca caserna” em que
se tornou a sociedade industrial. “O ocidente é um acidente!”
denuncia Roger Garaudy em “Apelo aos Vivos” com a autoridade de
quem sempre esteve nos pontos mais avançados de defesa política e
filosófica do que promove o humano no mundo.
Seguindo
com Malatesta: “Não podemos, de pronto, destruir o governo
existente, talvez não possamos amanhã impedir que sobre as ruínas
do atual governo um outro surja: mas isto não nos impede hoje, assim
como não nos impedirá amanhã, de combater não importa que
governo, recusando-nos a submetermos à lei sempre que isto seja
contrário aos nossos imperativos de consciência. Toda a vez que a
autoridade é enfraquecida, toda a vez que uma grande parcela de
liberdade é conquistada e não mendigada, é um progresso rumo à
anarquia. Da mesma forma, também é um progresso toda a vez que
consideramos o governo como um inimigo com o qual nunca se deve fazer
trégua, depois de nos termos convencido que a diminuição dos males
por ele engendrados só é possível pela redução de suas
atribuições e de sua força, não pelo aumento no número de
governantes ou pelo fato de serem eles eleitos pelos governados. E
por governo entendemos todo o indivíduo ou grupo de indivíduos, no
Estado, Conselhos etc. que tenha o direito de fazer impor leis
injustas sobre quem com elas não concorda”.
Contundente
e radical, repita-se, Malatesta e toda a tradição anarquista que
lhe segue proporá a chegada a um governo auto-gestionário, do qual
todos possam participar livremente. Um sistema auto-gestionário que
possibilite participar livre e alegremente de todo o processo
decisório e de execução do que terá sido decidido coletivamente,
para que se chegue ao maior aperfeiçoamento social promotor do
humano no mundo. Toda a vitória, por menor que seja, dos
trabalhadores sobre as classes patronais, todo o esforço contra a
exploração do homem pelo homem, toda a parcela de riqueza subtraída
aos proprietários e posta à disposição daqueles que a geraram,
toda a união amorosa plena entre duas pessoas que se amam intensa e
sinceramente, tudo o que se fizer para melhorar as condições
existenciais da maioria enfim, será mais um progresso, mais um passo
rumo à anarquia, “este sonho de justiça e de amor entre os
homens…”
Lázaro Curvêlo
Chaves – Primavera de 2000